Honorários advocatícios – Rescisão – Arbitramento

21\01\2009

A 28a Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, em acórdão relatado pelo Des. CELSO PIMENTEL (julgamento em 16 de dezembro de 2008), reconheceu que, ocorrendo a rescisão unilateral de contrato de mandato mantido entre escritório de advocacia e cliente, no qual não exista previsão sobre como seriam pagos os honorários advocatícios nessa hipótese, há interesse de agir para o pedido de arbitramento dos honorários advocatícios (art. 22, § 2o, do Estatuto da Advocacia). Com isso reformou sentença de primeiro grau e passou a julgar o mérito, determinando, quanto a esse ponto, a apuração do valor em liquidação, com a nomeação de perito, que deverá recair em advogado experiente, que, por sua vez, deverá levar em consideração as bases do contrato, o trabalho desenvolvido, suas circunstâncias e as chance de êxito (http://cjo.tj.sp.gov.br/juris/getArquivo.do?cdAcordao=3413404)

A sentença como entrave à sua reforma

21\01\2009

CLITO FORNACIARI JÚNIOR

A atividade jurisdicional, como é por todos sabido, é demarcada pelas partes, sendo que o autor, ao ajuizar a ação, formula o pedido e declina a causa de pedir, que consiste nos fundamentos jurídicos, em razão dos quais deduz sua pretensão. Assim, cria para o juiz a obrigatoriedade de decidir nos limites em que a ação foi proposta, pois é defeso ao magistrado conhecer de questões não suscitadas (art. 128 do CPC).
O réu, se não oferecer reconvenção e só contestar, pode trazer fatos novos, impeditivos, modificativos e extintivos do direito do autor, e criar questões, na medida em que torne controvertidos pontos afirmados pela parte contrária. Essa atuação do réu não amplia o âmbito da demanda, embora exija maior trabalho do juiz. Nessa linha, continua o conflito restrito ao mesmo pedido e à mesma causa de pedir, mas impõe a decisão daquelas questões, a partir das quais pode vir a ser negado o direito postulado pelo autor. Só em caráter excepcional, embora crescente ultimamente, ao juiz se faz possível conhecer de ofício de questões que possam influenciar no julgamento da causa, uma vez que ainda se prestigia, entre nós, o princípio dispositivo.
Uma decisão que não se pronuncie, expressamente, sobre o pedido, a causa de pedir e as questões criadas pelo réu em sua defesa, padece de omissão, que pode e deve ser questionada por qualquer das partes por meio de embargos de declaração. Esses devem, destarte, ser acolhidos, a fim de ser sanado o vício, pronunciando-se o órgão julgador sobre o quanto não poderia ter sido desprezado.
Essa síntese da atividade jurisdicional também se manifesta no âmbito recursal, notadamente quanto ao recurso de apelação, em cujo julgamento é devolvido ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada, o que guarda paralelo com o pedido e a causa de pedir. Além da matéria impugnada, devolve-se ao tribunal, por expressa disposição legal, o quanto foi suscitado e discutido nos autos, mas não decidido e, ainda, os fundamentos não acolhidos, se um deles o foi, de modo que se mostrou suficiente para o acolhimento ou rejeição da demanda (art. 515, §§ 1º e 2º, do CPC). Essa demarcação da atividade jurisdicional em segunda instância, do mesmo modo que o pedido e a defesa, em primeiro grau, é de observância rigorosa, advindo decisão viciada sempre que o acórdão de segundo grau não apreciar o quanto foi impugnado e o quanto foi devolvido por decorrência das previsões dos parágrafos do art. 515.
Essas considerações, que soam elementares, vêm à mente diante de decisão proferida pela 33ª Câmara de Direito Privado do TJSP (apelação cível n. 1133991-0/2, rel. CLARET DE ALMEIDA, julgado em 14.08.08), que modificou decisão de primeiro grau, reformando a base de cálculo para a incidência de percentual de honorários advocatícios, simplesmente a pretexto de não ter sido impugnada pelo credor prova que justificaria, ao ver da turma julgadora, a adoção de outro critério, que não aquele que fora definido pela sentença.
Examinando-se a sentença (processo n. 00.562254-9, prolator ALEXANDRE AUGUSTO P. M. MARCONDES, 12ª Vara Cível de São Paulo, julgado em 02.05.07), por sua vez, verifica-se que a adoção da base reformada em segundo grau deu-se com fundamentos, que não foram, entretanto, refutados pelo acórdão, que simplesmente externou a sua posição, a pretexto de falta de impugnação da parte que veio a ser afetada com o decisório, do que não cogitara a decisão de primeiro grau.
A matéria decidida estava no âmbito de devolução ao juízo de segundo grau, de modo que cumpria, como ocorreu, ser reexaminada. No entanto, para redefini-la, competia ao acórdão deter-se sobre os fundamentos desenvolvidos pelo apelante como razões que, em seu entender, justificariam a alteração da sentença. O recurso é dirigido contra a sentença, de modo que o apelante precisa derrubá-la, ainda que não exista resistência da parte contrária. Portanto, ao colegiado cumpre, ao decidir o recurso, não só refutar os pontos aduzidos pelo recorrido, mas, antes e acima disso, afastar o entendimento externado pela sentença atacada, o que há de fazer, apontando em que medida o quanto ela colocou como decisão e fundamentos está errado.
Isso se põe, pois a sentença, pode dizer-se, defende-se sozinha, prescindindo até do ajutório que costuma vir nas contrarrazões de recurso, tanto que, se o recorrido não oferecer resposta, não se verifica o efeito reservado para a falta de contestação, ou seja, não se considera o quanto afirmado pelo recorrente como verdadeiro (cf. JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA, Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 5º vol., 14ª edição, 2008, n. 463, p. 253). Dessa forma, com ou sem resposta, cumpre ao julgador encarar o tema deduzido nas razões de recurso, confrontando-o, em primeiro lugar, com o que consta da sentença, que não pode ser desconsiderada.
O que a sentença lança como fundamento para o acolhimento ou rejeição do pedido é ponto de apoio da decisão, que lhe dá substância e amparo para sobreviver e que, portanto, precisa ser superado para que se possa inverter a deliberação. O confronto com o antes decidido deve ser externado na fundamentação do julgado, integrando sua motivação, na qual deve constar, como ensina OVÍDIO BATISTA DA SILVA, a tese aceita pela decisão, mas também as razões pelas quais foi recusada a versão oposta (“Fundamentação das sentenças como garantia constitucional”, Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, n. 10, p. 16), que, no caso, é também aquela abrigada pela sentença.
Não tendo sido demonstrados, no acórdão, os motivos pelos quais a sentença estava equivocada e, como tal, não poderia subsistir, justificam-se os embargos declaratórios, por  omissão (art. 535, II), mesmo que não tenha o recorrido assumido como seus os fundamentos da sentença. Evidencia-se também contradição, uma vez que o acórdão substitui a sentença no que tiver sido objeto de recurso (desde que acolhido). Assim, em se manifestando diferentemente quanto à decisão em si, mas não tratando de refutar os seus fundamentos, o acórdão não os substitui, pois, como bem coloca RICARDO APRIGLIANO, a parte da decisão de primeiro grau sobre a qual o tribunal não se manifestar permanece válida (cf. A apelação e seus efeitos, Atlas, 2003, p. 278). Desse modo, revela-se decisão contraditória, pois os fundamentos que não foram reformados persistem, embora não sirvam de amparo para a nova decisão, que neles não consegue sustentar-se.
A não ser sanado o vício, ou seja, em não rebatendo o acórdão os fundamentos da sentença, resta ensejo ao recurso especial por violação à regra do art. 535, II, pois a omissão se revela da mesma forma que se mostra quando fundamentos deduzidos pelas partes são desprezados.